
Berta Cardoso, na Viela
Berta Cardoso, a Voz de Oiro do Fado, teve sempre um particular cuidado na escolha do seu repertório que, como se sabe, é vastíssimo. Dado o êxito que qualquer criação sua alcançava (lembremos, só como exemplo "Cruz de Guerra" e "Tia Macheta"), os poetas não só compunham intencional e expressamente para ela (lembre-se os fados "Cinta Vermelha" e "Homem da Berta"), como também lhe ofereciam muitas letras na esperança que ela as cantasse, o que nem sempre vinha a acontecer.
De facto, o espólio de Berta Cardoso, depositado no Museu do Fado, contém um número considerável de letras, que lhe foram oferecidas pelos mais variados poetas, e que ela nunca cantou.
Outras letras, contudo, terá pago, de resto como as pagavam as e os outro/as fadistas . Se assim não fôra, de que viveriam os poetas? Provavelmente, não do ar!; de facto, alguns eram assalariados, por isso não dependiam tanto da arte; mas, para outros, a criação de textos escritos ou musicais eram o único meio de subsistência. Se Berta Cardoso "pagava generosamente" as letras que decidia cantar, como refere o Senhor Professor Doutor Rui Vieira Nery, a páginas 210 do seu livro "Para uma História do Fado", editado pelo Público, isso só pode ser motivo de rejúbilo e aplauso, atestando a sua fama de boa pessoa; mais prova que Berta Cardoso não se servia da fama que tinha para explorar os que necessitavam, pagando pela tabela "normal"; antes, como podia, pagava "generosamente" aos seus poetas de eleição, que era uma forma de compartilhar o sucesso...
E não, Senhor Doutor!, não seria pelo facto de pagar generosamente que Berta atraía muitos dos melhores poetas do meio, como o senhor advoga...
De entre os documentos que deixou e de que nunca fez alarde ou uso para ganhar ou conseguir o que quer que fosse, Berta guardava este papel, qua abaixo transcrevo, escrito pelo poeta e compositor musical Júlio de Sousa, a quem se devem, entre outros, os conhecidos fados : Saudade vai-te embora, Não se morre de saudade, Mau olhado, Caminhos, Não digas a ninguém, Senhor perdoai, Vim para o fado, Loucura e tantos outros interpretados por vários fadistas, entre eles Berta Cardoso, Fernanda Maria, Beatriz Ferreira, Flora Pereira, Natércia da Conceição, Carlos do Carmo...
Que cada um tire as conclusões que entender!...
Quando escrevo uma canção
Penso em ti, na tua voz.
Tenho cheio, o coração
De mil canções, para nós...
És a Sereia da "Viela"
Berta Cardoso, "A Divina"
Na minha vida és Aquela
Que a minha vida domina.
Mando os versos prometidos
"Que prometeste" cantar
Se Eles não forem esquecidos
Eu te "prometo" voltar.
Minha Exmª Amiga
Hoje é em verso que lhe escrevo. As nossas "categorias" não permitem a prosa banal...
Um grande abraço de admiração afectuosa do POETA DAS DÚZIAS
Júlio