BERTA CARDOSO - "A Loucura dos Fadistas"
Foi com este verbete que, faz hoje dez anos, iniciei este blogue, num tempo em que muito pouco havia ainda na net acerca de Fado. Muitos outros blogues e sites foram depois aparecendo, podendo dizer-se que, hoje, se eu fechar portas, fica o assunto muito bem entregue e eu muito descansada porque não é lá por isso que se irá deixar de tratar de Fado por estes sítios. Mas também, diga-se de passagem, não penso encerrar tão cedo...:)
Poderia assinalar a data com mais "um vídeo daqueles", mas, pensando melhor, vou brindar com um excerto de um texto a propósito, de António Botto, in "Cartas que me foram devolvidas"
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"Não digas que o fado não presta. O fado, por mais voltas que lhe dêem, é um lamento do amor, uma nota de saudade no fundo musical de um povo de mareantes e contemplativos, uma doce cantilena sem complicações de fusas na simplicidade baça de uma vida sem destino. O fado nunca faz mal. É um cansaço de sons na lira do infortúnio. Afastá-lo dos que o metem nas versalhadas de pé coxo com ideias de serradura, isso é que era necessário. E seleccionar as gargantas; raspar-lhes a desafinação, o pigarro, e ajustar o tom e as palavras no compasso do equilíbrio, da harmonia, e da beleza. Reprovar o que não presta. Deixá-lo ser verdadeiro, ungido naquela graça que é feita de uma tristeza que nasce do coração, e não lhe dar tremidinhos histéricos de baiana nem lhe meter histórias de comadres desavindas ou patrióticos disparates de bobos sem rei nem roque. Servem-se dele, do triste, para todos os salsifrés, e o pobre geme e suspira mascarado de vadio. Deixem-no andar isolado à mercê da inquietação que nasce da própria vida sem comando e sem contrôle porque o fado já não pode com tanta literatice. Rasguem e queimem essas cantiguinhas tolas que ele acompanha contrafeito. Debrucem-se, os poetas, na chaga social dos factos que entristecem a existência da hora actual tão profunda na tragédia e tão alta no anseio!..."
Assim falava António Botto, esse enorme poeta que também cantou o Fado
Assim falava António Botto, esse enorme poeta que também cantou o Fado
D.L.1925
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